O projeto Falando Direito e a Justiça Brasileira

 

O que nos diz a Justiça brasileira da atual litigiosidade?

A sociedade brasileira tem implantada sobre si a cultura do litígio, em que a extrema judicialização é a marca de um sistema de Justiça incapaz de resolver as demandas sociais.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em sua décima edição do Relatório Justiça em Números, apresenta o grau de litigiosidade no Brasil representado por cerca de 95 milhões de processos em tramitação, o que significa uma demanda judicial para cada dois brasileiros.

Sobre esse número, o Relatório aponta que o Brasil encontra-se em posição de vanguarda nas estatísticas judiciais, tendo que, diante desse cenário, pretende-se que os dados e análises apresentados sirvam à reflexão do público e ofereçam subsídios para um debate mais qualificado para se pensar em novos caminhos em direção à efetiva garantia de direitos no país.

Ora, em outras palavras, são necessárias estratégias eficientes para lidar com tantos litígios, estando este desafio a cargo dos atores do sistema de Justiça. A principal utilidade desses dados do Poder Judiciário brasileiro é servir para a realização cooperativa e compartilhada dos objetivos republicanos de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, que garanta o desenvolvimento nacional, reduza as desigualdades sociais e regionais e promova o bem de todos, conforme aponta o art. 4º, da Constituição Federal.

Ao longo dos dez anos da primeira edição do relatório Justiça em Números, segundo o documento, quase todas as leituras das estatísticas judiciais redundaram em diagnósticos de crise, em especial pela estabilidade do congestionamento das cortes, onde os processos pendentes de julgamento continuam crescendo no último quinquênio, com aumento de 58,9 milhões em 2009 para 66,8 milhões de processos em 2013. Isso significa que os estoques de processos se ampliaram.

Portanto, as prioridades devem ser políticas de desjudicialização, e não apenas estratégias para reduzir o congestionamento. Até porque, nada adianta julgar os milhares de processos pendentes, se é sabido que, concomitantemente, milhares de novos casos surgirão.

Estamos falando de 95,14 milhões de processos na Justiça, sendo que, dentre eles, 70%, ou seja, 66,8 milhões já estavam pendentes desde o início de 2013, com ingresso no decorrer do ano de 28,3 milhões de casos novos (30%). É preocupante constatar o progressivo e constante aumento do acervo processual, que tem crescido a cada ano, a um percentual médio de 3,4%.

Vejamos os gráficos abaixo que estão disponíveis no relatório em questão:grafico10

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Em linhas gerais, há um crescimento da litigiosidade de forma mais acentuada que os próprios recursos humanos e as despesas. Enquanto que, no último ano (2013), houve crescimento de 1,5% nos gastos totais, 1,8% no número de magistrados e 2% no de servidores, tramitaram cerca de 3,3% a mais de processos nesse período, sendo 1,2% a mais de casos novos e 4,2% de casos pendentes de anos anteriores. Já o total de processos baixados aumentou em apenas 0,1% em relação ao ano anterior, ou seja, o aumento na estrutura orçamentária, de pessoal e da demanda processual dos tribunais não resultou necessariamente em aumento, proporcional, da produtividade.

Enfim, é fácil perceber que não transformaremos um cenário que tem a sua raiz social com soluções apenas administrativas. Como fazer?

Como construir uma nova forma de convivência entre as pessoas, e entre o povo e o Estado?

Informar o povo sobre o que nos regra é a saída para promover a cidadania e despertar a capacidade de ter opiniões válidas e decisões acertadas, sem a necessidade de socorrer-se ao Judiciário.

O artigo 3º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB, aponta que “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”. Ora, se o cidadão é expressamente proibido de alegar a ignorância da lei, é porque o Estado assume a responsabilidade de informá-lo das normas jurídicas.

Essa ideia passa a ser sedimentada quando ponderamos sobre a importância do cidadão que, a partir dos 16 anos, tendo em mãos o seu título de eleitor, fiscaliza os atos da gestão pública, podendo atuar de modo diligente e mudar o rumo de atuação da Administração Pública na sua comunidade.

Existe um complexo de situações que qualquer pessoa está submetida, mas, que, a maioria não possui o mínimo conhecimento para lidar e entender, o que gera demandas judiciais desnecessárias, já que poderiam deixar de existir se tivéssemos enraizada em nosso meio a prática do respeito, traduzida no exercício da prevenção, em vez da cultura do litígio.

A instrução de assuntos práticos, como aprender que quando se compra uma televisão com vício, podemos exigir, alternativamente e à nossa escolha, a substituição do produto por outro da mesma espécie, a restituição imediata da quantia paga, ou, ainda, o abatimento do preço; que o dever de sustento dos pais em relação aos filhos transcorre, também, pela obrigação alimentar; que o trabalhador tem a garantia da irredutibilidade do salário; e que, nenhuma criança, jovem ou adulto pode deixar de estudar por falta de vaga, gera efeitos culturais imensuráveis.

Ademais, o acesso à ordem jurídica justa não se realiza apenas pelo direito público subjetivo de propor uma ação, mas pela educação sobre aquilo que enseja uma demanda judicial, ou melhor, pela divulgação da informação jurídica que regra situações cotidianas de todo e qualquer ser humano.

Dessa forma, construímos uma nova forma de convivência, onde se informa para depois responsabilizar e, não, responsabilizar para depois informar.

E assim, é claro que depois da informação, o grau de responsabilização, isto é, da necessidade de atuação do Poder Judiciário, diminui.

Essa educação é a tradução de um novo foco para a história da humanidade, onde conhecer aquilo que nos regra é saber se comportar e ser um cidadão proativo que aspira e desperta a transformação da cultura social, ética e política arraigada no mundo que o cerceia.

Assim, consolidamos uma alteração profunda de paradigmas na sociedade, saindo da conjuntura do analfabetismo em direitos para o da cultura do direito social a informação jurídica qualificada.

Portanto, a estratégia mais eficiente para lidar com tantos litígios é a educação em direitos.

O que devem fazer as instituições que operam o Sistema de Justiça?

Se o Estado tem o dever de informar, as instituições que operam o sistema de Justiça, como atores da aplicação legítima da lei, tem a responsabilidade de fazer valer o direito a ter o direito de ser informado da lei antes de ser responsabilizado por esta.

Com a efetivação da educação em direitos, essas instituições nada mais fazem do que cumprem com os seus respectivos papeis.

A proposta de educação em direitos para o Brasil

A Associação de Magistrados do Distrito Federal (Amagis/DF), a Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), em conjunto com o Aula Móvel – Ensino Online e diversos parceiros, disponibilizam o projeto “Falando Direito” para que as Associações das Defensorias Públicas de todos os Estados e Distrito Federal, bem como qualquer instituição do sistema de Justiça possam utilizar essa tecnologia social em todas as cidades brasileiras.

Essas instituições pensam em uma sociedade protagonista da efetivação do direito a ter direitos, onde essa ideia será sedimentada na socialização do conhecimento jurídico on-line, em plataforma com aulas dos melhores defensores do país, com suporte presencial aos defensores públicos e as respectivas associações espalhadas pelo país.

Desse modo, como Estado que somos, vamos concretizar um direito social, responsabilizando o cidadão por meio da informação de qualidade, que estará incorporada no currículo escolar por meio do trabalho de empresas com responsabilidade social e instituições do sistema de Justiça.

Seremos as primeiras empresas e instituições a trabalhar com a educação visando uma nova forma de convivência, onde se informa para depois responsabilizar e, não, responsabilizar para depois informar, erguendo a bandeira da prevenção e do diálogo como medida de evitar a extrema judicialização manifestada nos dias atuais.

O objetivo é formar pessoas que poderão trabalhar suas questões pessoais sem a necessidade de socorrer-se ao Judiciário, saindo da conjuntura do analfabetismo em direitos para a cultura da informação qualificada.

Isso significa educar o ser humano para assumir o seu lugar no mundo, sendo coerente e responsável diante da dimensão estatal, pois, conhece e aplica, naturalmente, conhecimento mínimo em situações cotidianas, gerando a mudança da cultura do litígio para a prática do respeito entre as pessoas, e entre o povo e o Estado.

Estamos corrigindo um erro histórico, já que ao proibir o cidadão de alegar ignorância da lei, o Estado assumiu automaticamente o dever de socializar a informação jurídica.

Nessa esteira, essas pessoas conhecerão instituições que respeitam o povo brasileiro, pois tratam a educação como um dever e responsabilidade de todos, conforme estampado na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Organização da Defensoria Pública. Seremos conhecidos pela nossa sensibilidade, humanidade e, sobretudo, agentes políticos de transformação social.

Boas instituições elevam a qualidade da educação, cumprindo o seu dever social, boas pessoas divulgam conhecimento, e, assim, respondemos pela evolução de um Estado que deve orientar-se para o povo e pelo povo.

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